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O CONTROVERSAS
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Este blog foi criado para divulgar e documentar a 14ª edição do Controversas, nos dias 26 e 27 de novembro de 2018, no auditório InterArtes do Instituto de Artes e Comunicação Social da UFF. Desta vez, nosso tema é a eleição 2018. Vamos debater questões como a cobertura sobre as eleições, o mercado de trabalho nas campanhas eleitorais, o uso de tecnologias a serviço da caça aos votos e o cenário político pós eleitoral. Conversas temperadas com controvérsias nos aguardam!

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Desafio: não fazer da checagem uma censura

Atualizado: 24 de out. de 2018

Para editora-assistente do Aos Fatos, método e parcerias reforçam ações


Por Carolina Monteiro, Julliana Martins e Rayssa Moura*


Ana Rita Cunha é editora-assistente do Aos Fatos, uma agência jornalística e plataforma brasileira digital especializada em checar o discurso público, criada em 2015. Este ano, a agência desvendou o circuito de desinformação online que se criou em torno da vereadora Marielle Franco, logo depois de seu assassinato, e nestas eleições tem como objetivo conferir a exatidão dos discursos dos candidatos. Além disso, realiza apurações para esclarecer fatos correntes nas mídias e realizou uma parceria com o Facebook para checagem de informações. Para isso, desenvolveu o robô Fátima, nome que vem de “FactMa”, de FactMachine, e que atua por meio do Messenger, o sistema de mensagens da rede social. A agência também atua diretamente no Twitter. Nesta entrevista, Ana Rita conta como a agência se prepara tecnologicamente para desvendar boatos e como busca reforçar seus métodos para não fazer da checagem em redes sociais uma censura. 


Você cobriu as eleições municipais cariocas de 2016 e agora vai cobrir as eleições de 2018. De que forma acredita que o meio digital pode impactar a cobertura política?

Em 2016, a gente fez o acompanhamento dos debates em tempo real e também checamos antes o debate, as promessas, os candidatos, se elas (as promessas) variaram ao longo da campanha. Enfim, se eles tiveram contradições entre o que eles afirmaram sobre assuntos ao longo da campanha. Em 2018, a gente também está fazendo a cobertura das eleições. Eu acho que é muito importante a gente acompanhar as entrevistas como os debates em tempo real. E também estar em parceria com o Facebook, fazendo checagens de notícias sobre o que as pessoas consideraram falsas. Então a gente vai atrás para ver se é mesmo.​



Ana Reginha Cunha, do Aos Fatos/ divulgação


O que você espera ao cobrir as eleições de 2018?

O momento das eleições é muito interessante para ser jornalista, um momento em que você pode oferecer informações para que as pessoas tomem sua decisão. Tem um impacto muito grande na escolha de sua liderança. A partir de informações claras, o jornalista tem o papel de criar um debate baseado em fatos, tentar esclarecer dúvidas. O jornalismo tem um papel muito essencial. Eu acho que vai ser um pouco tenso, os ânimos estão exaltados, as pessoas estão desacreditadas, meio céticas com os representantes políticos. Vamos lidar com pessoas muito descrentes e ao mesmo tempo as pessoas estão com medo, não é? Com medo, elas se agarram mais fortemente às suas visões iniciais. Então, teremos que fazer um esforço extra para nos


E como o meio digital impacta a cobertura política?

Eu acho que essa questão de você ter hoje a disseminação de boatos pelas redes sociais, boatos que sempre existiram em épocas de eleição, são formas de tentar manipular e direcionar o debate. Mas o meio digital, as redes sociais, o Whatsapp, tudo isso amplia muito mais até aonde chega uma informação. Então, de repente você está focando na cobertura só nas falas dos candidatos, mas em alguns momentos acaba sendo importante também cobrir os boatos que circulam, que não é uma declaração pública de um candidato específico. Um grande compartilhamento de boato acaba virando uma pauta. Por haver uma produção de conteúdo muitas vezes falsa sobre os candidatos, para além das declarações dele, isso acaba pautando um pouco a cobertura política.

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Qual é a relação de vocês com a tecnologia? Como ela pode ser usada a favor do jornalismo?

Nossa estratégia este ano é usar um pouco da tecnologia que se usa para disseminar informação, inclusive notícias falsas. Estamos desenvolvendo alguns robozinhos (bots) para poder distribuir a informação ancorada em fato. Desenvolvemos um chat no Messenger (Fátima), do Facebook, para que as pessoas possam colocar as informações das quais tenham dúvidas da veracidade. A ideia não é bater o martelo para dizer se é verdadeiro ou falso, mas oferecer caminhos, perguntas que a pessoa pode fazer, caminhos que ela pode seguir para verificar a informação. Caso a gente já tenha algum conteúdo produzido sobre aquilo, compartilhamos. A outra forma é pelo Twitter, que é para quando as pessoas compartilharem informações falsas e a gente já tiver checado, para enviarmos as nossas checagens. Para a pessoa saber e também ser exposta aos fatos sobre aquela questão. Com o robô, você configura um software para ele fazer uma série de ações de forma repetida, seja postar alguma coisa repetidamente, inflar uma informação curtindo repetidamente uma coisa num nível para além da capacidade do ser humano ou postar milhões de postagens por segundo. É importante pensarmos em como rivalizar com isso. A gente já começa a corrida meio atrás porque não tem tanto braço para checar todas as informações falsas. Então pensamos a tecnologia como uma forma de ampliar a nossa capacidade de transmitir notícias ancoradas em fatos. 

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Vocês foram o primeiro veículo a checar e desmentir os boatos que circularam nas redes sobre a vereadora Marielle Franco após seu assassinato. Como foi checar esse caso em particular? Como esse trabalho impactou o público das redes sociais?

A checagem no caso da Marielle tem questões muito particulares. Você tem que fazer checagem de um fato para o qual não foram apresentadas provas. Ela foi acusada de ser casada com Marcinho VP. Você tem certidão de casamento, mas não tem certidão de solteiro. No caso dela, havia uma facilidade porque como, ela era vereadora, ao se inscrever no TSE (Tribunal Superior Eleitoral), é preciso apresentar uma declaração do estado civil. Você tinha essa questão de como provar a inocência ou como checar uma informação que estava sendo falada quando quem fez a acusação não tinha nenhuma prova. Eu não tinha que checar se o documento que falava que ela era casada era falso ou verdadeiro, eu tinha que comprovar que ela nunca tinha sido casada. Foi muito complicado esse processo. As pessoas falavam: “Ah, ela tinha recebido doação do Comando Vermelho”. A gente checou todos os CPFs das pessoas que tinham feito doação para ela e se elas tinham algum envolvimento com o tráfico. É um exercício de tentar rebater uma informação falsa que vem sem nenhuma prova. Foi muito importante porque as pessoas estavam incomodadas com aquela discussão, mas ninguém sabia como desmentir aquilo. Então, a gente produziu um conteúdo que desmentia uma série de questões sobre ela no momento do assassinato. Logo após termos publicado a notícia desmentindo os boatos sobre a Marielle, começou uma movimentação diferente. A curva de compartilhamento desmentindo começa a reduzir a curva de compartilhamento de notícias falsas. Não somos super-heróis que combatemos notícias falsas, mas eu acho que a gente conseguiu gerar na hora que precisava a informação factual para esclarecer. O compartilhamento da versão verdadeira superou o compartilhamento das notícias falsas. Esse foi um impacto relevante. É um exemplo que mostra que a checagem importa.

Vocês fazem parte de uma parceria com o Facebook e a Agência Lupa (também de checagem de fatos) para verificar  notícias falsas na rede. Qual a importância das parcerias para a checagem jornalística? Como funciona o programa?

A parceria que a gente tem com o Facebook junto com a Lupa e com a AFP (Agência France-Presse), de verificação de notícias falsas na rede, é muito interessante justamente porque temos essa limitação de como atingir as pessoas que compartilham o conteúdo noticioso falso e como lidar com esse conteúdo. Um dos problemas que a gente tem é como não transformar a checagem em uma censura. A parceria com o Facebook é uma alternativa para lidar com isso e checar sem censurar. Os usuários podem denunciar no Facebook se eles acham que uma informação que está circulando é falsa. O que a gente faz é avaliar se esse conteúdo é falso ou verdadeiro. A partir do momento em que fazemos isso, publicamos essa checagem e quem compartilhar aquela informação vai saber que foi classificada como falsa. Ela pode optar por continuar compartilhando, mas vai ser notificada e receber a nossa checagem, explicando por que foi ela considerada falsa. Também o Facebook vai diminuir o compartilhamento orgânico daquela postagem.

comunicarmos melhor e conseguir transmitir melhor as informações. Vai ser uma cobertura bastante desafiadora.


Como é a sua rotina de produção de conteúdo no Aos Fatos?

Primeiramente, como a gente seleciona nossas pautas, nosso foco é na checagem de declarações públicas relevantes para o debate público que não sejam opiniões nem previsões. A gente só checa o que é uma declaração factual se uma pessoa dá opinião sobre um assunto. Opiniões não checáveis são visões sobre uma realidade, bem como previsões, que não se concretizaram. A gente tem esse foco. Agora, com a parceria do Facebook, temos também outro foco que é o debunker, de combater boatos. Se alguém produz uma informação falsa, vamos atrás para dizer se é falsa ou não, para falar sobre boatos. Um terceiro tipo de produção jornalística são as pautas que escolhemos, para explicar algo que está acontecendo. Tentamos trazer dados para entender alguma questão. Recentemente, fizemos uma reportagem em parceria com a Nova Escola sobre custo do aluno. Como dentro do debate da educação sempre tem essa discussão, trouxemos dados para ajudar a entender quais são os custos da educação. Acho importante ter essa informação pois quando um político falar “vou aumentar x escolas”, você vai saber de que dimensão de gastos se está falando. Às sextas-feiras, a gente se senta para pensar o que temos de pautas previstas, entrevistas... No caso da cobertura de eleições, um dos pré-candidatos tem alguma previsão de entrevista para semana seguinte, vamos ficar de olho para checar. Pode ser que a entrevista seja cancelada ou que ele não fale algo importante para o debate publico. Por exemplo, ficar comentando sobre a raça do cachorro, esses fatos que só interessam para esfera pessoal e não muito para o debate público... Aí a gente não vai checar. Enfim, a gente olha essas coisas previstas e temos algumas ideias de pauta de reportagens que vamos apurar e definimos isso. As checagens no Facebook nós vamos vendo ao logo da semana, vemos o que aparece de importante para ser checado... Temos essa organização prévia do que a gente espera, mas sempre pode o [Michel] Temer fazer uma declaração sobre determinada questão e muito provavelmente, como ele é presidente da república, nós teremos que separar um espaço para falar sobre isso. Temos o planejamento da semana mas precisamos ter uma flexibilidade, como uma tragédia como o assassinato da Marielle, que não estava no script. É um acontecimento relevante que gerou boatos e a gente foi lá e checou.

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Como é fazer parte de um site que tem o objetivo de checar o que os políticos e outras autoridades comentam e verificar se é um fato verdadeiro?

É uma responsabilidade enorme e bastante desafiador. Como qualquer atividade jornalística, a checagem tem o desafio de saber comunicar bem e de ficar revendo o tempo inteiro se a forma como você esta explicando e falando é bem compreendida. Você vai aprendendo e vendo a reação da audiência para passar melhor a informação, para que seja a mais clara e informativa possível. Tem outra questão que é a forma como as pessoas reagem às checagens... Quando falamos “tal político falou alguma coisa falsa”, as próprias autoridades, políticos ou às vezes os partidos reagem dizendo: “Ah, mas você está falando que a pessoa é mentirosa, é horrível?”. Não necessariamente. A nossa ideia não é ficar dizendo quem mente e não mente, mas incentivar a transparência no debate público. O papel do jornalismo como um todo é também esse, mas a ideia da checagem nasce e se fortalece para ser mais um esforço nesse sentido, para um debate mais transparente. Quando estabelecemos os selos, a gente seleciona a declaração que vamos checar, olhamos a fonte à qual a informação foi atribuída, vamos atrás das fontes oficiais e alternativas, para poder contextualizar aquilo. Em geral, as declarações não são só falsas ou verdadeiras, tem uma nuance sobre a qual é importante falar, porque contextualizar a informação é muito relevante. Às vezes, um político fala “ah eu inaugurei 50 creches esse ano” e ele realmente inaugurou, mas inaugurou atrasado, porque as creches estavam previstas para o ano anterior. É um detalhe importante de contextualizar, para garantir que as pessoas entendam o que aquela pessoa está falando. Às vezes, somos muito cobrados, fala-se assim: “Ah, vocês ficam querendo que os candidatos decorem, sejam robôs que decoram números”. Não, a gente não quer, não é isso. Só que tem muitos candidatos, muitos políticos que usam esse discurso da exatidão dos números para dizer que conhecem um assunto. Usam essa narrativa de que são especialistas. Checar o número não é mais justo do que ver se eles realmente estão correspondendo a essa narrativa que querem passar. Se você está se preparando para um debate e vai citar um número muito exato e não é aquilo, é importante as pessoas saberem que não é isso. Principalmente em momento de polarização, as pessoas tendem a ser muito emotivas em relação à checagem, mas acho que também tem a ver como melhor transmitir a informação. Os incômodos e os ruídos que aparecem servem de reflexão para pensarmos como nos comunicarmos melhor com nossos leitores, pensar nossos critérios... E como a gente segue o código de conduta da IFCN (Internacional Fact-Checking Network), uma rede internacional de checagem, de checadores, de plataformas de checagem, ao mesmo tempo em que falamos sobre sermos cada vez mais transparentes, também temos que ter total transparência com nossos métodos e formas de financiamento.



Guia para checagem de fatos elaborado pela equipe do Aos Fatos.Acesse aqui


* Texto escrito originalmente para a disciplina "Jornalismo Para Plataformas Digitais" da professora Rachel Bertol.

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